Uma “bomba-relógio”: trabalhadores do INEM desmentem “opinião ...

O INEM poderá já não contar com um modelo de inteligência artificial no atendimento de chamadas como fora prometido no final do ano passado pela ministra da Saúde, Ana Paula Martins. O responsável da empresa que tinha oferecido os seus serviços ao Ministério da Saúde para este trabalho afirmou que “o sistema [do INEM] está em risco e não pode acontecer” e que “estamos perante uma bomba-relógio”, em declarações ao semanário Expresso. Os trabalhadores do INEM, no entanto, desmentem essa “opinião alarmista”.

Num comunicado enviado esta sexta-feira, a comissão de trabalhadores do INEM afirma que é “absolutamente falso” que o sistema de triagem se encontre “numa situação de ‘bomba-relógio’ e de colapso iminente”, lê-se. “Não se devem confundir os profissionais do INEM com a incapacidade de empresas externas ao INEM em implementar soluções que na nossa opinião são impossíveis, opinião essa transmitida ao conselho directivo do INEM e à sr.ª ministra da Saúde em Dezembro passado.”

Virgílio Bento, director executivo da empresa Sword Health, referiu que “não é possível integrar” a solução desenvolvida no INEM e atacou os profissionais do INEM: “A equipa ficou perplexa com a incapacidade dos técnicos, mais ainda por se tratar de um sistema crítico, absolutamente essencial”, disse ao Expresso esta sexta-feira.

Há quase dois meses que Ana Paula Martins anunciou um modelo de inteligência artificial “pro bono” da Sword Health que seria implementado nas centrais de resposta a emergências médicas do INEM. Nunca se soube como funcionaria, que salvaguardas teria para os dados dos cidadãos ou como se garantia que a empresa de Virgílio Bento não utilizaria os dados recolhidos para outros fins.

Desde o dia 16 de Dezembro que o PÚBLICO tem questionado a Sword Health e o Ministério da Saúde sobre o funcionamento deste modelo de inteligência artificial, as suas salvaguardas, custos e prazos, mas nunca obteve qualquer resposta das duas entidades. O PÚBLICO voltou a contactar a empresa esta sexta-feira, mas sem sucesso.

O modelo que a Sword Health afirma que pretendia utilizar no INEM está criado e treinado, tendo sido partilhado por Virgílio Bento na rede social Linkedin, com uma demonstração em que os funcionários da empresa recriam uma potencial emergência. Os testes às valências deste modelo necessitariam de acesso às chamadas gravadas do INEM. “Nunca tivemos acesso às mesmas, o que tornou significativamente mais difícil o desenvolvimento do sistema”, escreve o responsável da Sword Health. Uma vez que são dados sensíveis, o seu acesso necessita de pareceres da Comissão Nacional de Protecção de Dados.

Este modelo não será, pelo menos para já, integrado no INEM. A oferta da Sword Health, que nunca terá sido formalizada oficialmente com o Governo, surgiu depois de um período conturbado no INEM, com falhas e atrasos na resposta do serviço devido à greve dos técnicos de emergência pré-hospitalar.

“O INEM não precisa de um sistema de substituição incapaz de lidar com as subtilezas do discurso e análise humanos”, diz a comissão de trabalhadores do INEM no comunicado. “O problema está identificado e encontra-se em resolução e passa pela contratação de recursos humanos.”

Os benefícios da aplicação da inteligência artificial na saúde e nos cuidados médicos têm sido claros na investigação científica ao longo dos últimos anos, sobretudo enquanto ferramenta complementar para os profissionais de saúde. No caso desta ferramenta da Sword Health, apesar de se saber que o intuito seria fazer a triagem das chamadas e o atendimento, nunca foram dadas informações específicas sobre o seu funcionamento e o acesso que seria dado à empresa dos dados dos cidadãos que contactam o INEM.