O que vai vestir o Papa Francisco em Lisboa? É burel e português ...
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Já muito se detalhou sobre a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) e a vinda do Papa Francisco a Portugal para o maior encontro com jovens de todo o mundo. Sabe-se o que irá fazer o pontífice durante os dias em que estará em Lisboa (2 a 6 de Agosto) e como será a missa de encerramento no Parque Tejo, mas até agora pouco se tinha falado do que vai vestir o Papa — ademais das suas habituais e indispensáveis vestes brancas. Os paramentos de Francisco terão burel, a lã da Serra da Estrela, símbolo da tradição portuguesa.
Além dos paramentos do Papa Francisco, “estão ser produzidos um total de dez mil paramentos para os sacerdotes e bispos que participarão nas cerimónias religiosas”, avança a JMJ ao PÚBLICO. O fabrico é feito entre Portugal e Itália, de onde vêm tipicamente a maioria das vestes dos sacerdotes.
Mas há um detalhe que as torna mais especiais do que as comuns casulas usadas pelos padres nas eucaristias. “É a primeira vez que o burel é usado numa veste papal, representando o símbolo da participação do interior do país — e da cultura tradicional portuguesa”, anuncia-se.
Isabel Costa é uma das fundadoras da Burel Factory, a marca de Manteigas que recuperou esta lã tradicional, e não tem rodeios em afirmar que o Papa Francisco é a personalidade mais importante de sempre a usar burel. “É um grande orgulho, como portugueses e como empresa”, celebra, reconhecendo que a “notoriedade faz diferença” e terá impacto positivo no negócio.
Conta ao PÚBLICO ter sido contactada há cerca de oito meses com uma proposta para participar na confecção dos paramentos oficiais da JMJ. Primeiro, viram amostras e cores, depois fizeram-se testes com a empresa sul-italiana responsável pela confecção. “Queriam usar elementos nacionais e lembraram-se do burel por estar relacionado com ovelhas e pastores. O Papa é o pastor do Rebanho”, recorda, levantando o véu sobre o design ainda no segredo dos deuses.
O burel, em nome da sustentabilidade, é usado em cor natural, uma espécie de cru, para evitar tingimentos da fibra “natural, reciclada e totalmente biodegradável”. Depois é então bordado com cores e a fio de ouro para ser aplicado em várias peças nos paramentos — incluindo na mitra do Santo Padre. Na veste papal, vai ainda dar vida a uma faixa da principal casula a usar na missa de encerramento, a 6 de Agosto, em Lisboa.
E pode parecer estranha a opção num dos meses mais quentes do ano, mas esta fibra é apropriada tanto para o frio, como para o calor. O burel, um tecido rude e resistente, é feito com a lã das ovelhas da serra, das raças bordaleira e mondegueira. Era considerada uma lã menos nobre e historicamente foi usada pelos pastores para se protegerem do calor enquanto apascentavam os seus rebanhos. “É térmica e tem uma absorção de humidade elevada. Além disso, é só usada em pequenos apontamentos”, destaca a fundadora da fábrica, detalhando que o burel corresponde a 5% da dimensão de cada paramento.
Isabel Costa não sabe precisar quantos metros de burel forneceu para os paramentos, mas toda a lã foi paga pela Igreja, já que assim “fizeram questão”. E assevera: “Mas não é a expressão económica que está aqui em causa, porque não tem muita. É a expressão de valorização.”
Na loja online da JMJ, também há paramentos à venda, mas sem burel. Há, por exemplo, uma estola bordada a dourado com o logótipo da jornada (89€), mas também uma opção mais económica, com os símbolos sublimados (40€).
Depois do maior encontro de jovens em Lisboa, os sacerdotes e bispos de todo o mundo vão levar os paramentos feitos com burel como uma recordação destes dias históricos, incluindo o Papa Francisco, claro. Quem sabe, não estará qualquer dia na Basílica de São Pedro, no Vaticano, a celebrar a eucaristia com uma casula de burel português.
“Todas as pessoas que usam burel são muito importantes, mas o Papa Francisco é reconhecido internacionalmente. É um bocadinho de burel pelo mundo”, termina Isabel Costa, evocando o exemplo da rainha Santa Isabel que escolheu ser enterrada com um manto de burel.